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A nova política de preços dos planos de saúde, proposta pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e discutida em audiência pública no último dia 7, deve trazer mais transparência no cálculo de reajuste dos planos coletivos, que são “difíceis até para a agência reguladora compreender”, na avaliação do diretor-presidente do órgão, Paulo Rebello.
Em entrevista ao GLOBO, ele afirmou que a proposta não é definir uma fórmula padrão, mas exigir que os contratos deixem claro quais indicadores são considerados na definição do aumento. Rebello também destacou que, caso aprovada, a revisão técnica dos planos individuais “não será corriqueira”.
Concedido a operadoras em desequilíbrio econômico-financeiro, o mecanismo autoriza reajustes excepcionais nos contratos, além do aumento anual, que tem percentuais limitados pela agência. A ideia, diz, é que o aumento extra seja repassado aos usuários de maneira gradual, diluído em até cinco anos, e sem uma reincidência anual pelas operadoras.
A necessidade de as operadoras terem que expandir a venda de planos individuais, cada vez mais escassos, também pode ser um dos requisitos para o reajuste técnico.
Um dos temas mais sensíveis no pacote proposto pela ANS é a revisão técnica dos planos individuais. O que a agência propõe como requisitos para as operadoras que pedirem revisão?
Travamos essa discussão dentro da agência desde 2015, em três macrotemas: sustentabilidade, transparência e concorrência. E, dentro disso, está a revisão técnica. Pensamos se já estabeleceríamos uma proposta de norma, mas optamos por uma diretriz para o mercado apresentar soluções. O que já discutimos é que, para submeter um pedido, a operadora precisa estar vendendo plano individual. Além disso, a revisão precisa ser aplicada em toda a carteira dos individuais, sem seleção. São alguns dos requisitos e que podem servir como norte. Vamos agora colher informações com o setor e estruturar uma norma. A ideia foi deixar aberto para que a sociedade apresente aquilo que concorda ou não, e estamos abertos para ouvir essas propostas, uma vez que na audiência pública não vimos nenhuma proposta.
Mas o que vemos no mercado é cada vez menos planos individuais, e usuários indo para planos coletivos por adesão, muitos como MEI. Aumento de oferta de individuais é uma opção de requisito para a revisão?
É uma opção. Hoje a maioria das operadoras vende plano individual. As grandes, nos grandes centros, não têm esse apetite, obviamente pela impossibilidade de rescisão unilateral do contrato e também da agência ser responsável por estabelecer o reajuste máximo. Quando a gente busca revisão técnica, o intuito é estimular a venda dos individuais e melhorar o acesso.
Desequilíbrio econômico-financeiro é uma reclamação comum do setor. A regulamentação da revisão técnica não pode abrir margem para uma corrida de pedidos de aumento além do teto anual?
Já começamos a ver uma retomada (econômica pós-pandemia), tanto que no primeiro e no segundo trimestres tivemos um resultado operacional positivo em torno de R$ 2,4 bilhões. E a sinistralidade (uso do plano) também está caindo. Dito isso, não é só o fato de a operadora apresentar um pedido de revisão técnica que a agência vai autorizar. Vamos obviamente observar requisitos específicos. Então, não será uma situação de todas as operadoras estarem submetendo à agência um pedido de revisão técnica, não vai ser assim.
O reajuste técnico seria repassado em até quanto tempo aos consumidores?
Não será uma situação corriqueira, de todo ano a operadora solicitar, nem de todas as operadoras estarem submetendo à agência uma revisão técnica. Não vai ser assim. Acho que terão que ser estabelecidos ciclos. E tem que ter uma diluição desse repasse para o consumidor e, durante esse período, a operadora não pode solicitar uma nova revisão técnica. Estabelecer um prazo de três a cinco anos seria, ao meu ver, o adequado para que a gente pudesse apresentar ao mercado. É uma defesa minha.
E em relação aos coletivos? Qual modelo de fórmula de reajuste a ANS vai propor?
O que queremos é um pouco mais de transparência, com uma cláusula em que seja possível entender quais são os indicadores adotados pela operadora no cálculo. Quando olhamos os contratos, as informações são difíceis até para a agência reguladora compreender. Por exemplo: há contratos que estabelecem uma taxa estimada de ampliação do rol de procedimentos, ou seja, uma lógica de subjetividade que dá margem para, talvez, a operadora incluir situações específicas que não são possíveis de prever. Nos individuais, temos uma fórmula de reajuste em que, antes da agência divulgar, as operadoras já têm uma ideia do percentual.
Então, poderemos ter um modelo similar nos coletivos?
Não seria uma fórmula, seria (a exigência de) que a operadora estabelecesse qual os indicadores que ela vai adotar. Cabe à operadora. Ainda estamos vendo de que forma essa proposta vai avançar. Mas a ideia é que os contratantes possam, de fato, bater o olho e entender o que foi aplicado no cálculo.
Depois da audiência pública, quais são os próximos passos? Precisa de mudança legal?
Teremos a tomada pública de subsídios, acredito que a partir de quarta-feira, para que a sociedade possa apresentar suas contribuições, críticas, num prazo de 15 dias. Vamos estudar o que for apresentado e, caso entendamos que deva avançar, estabelecer uma norma, que precisa passar por consulta pública antes de ser analisada pela Advocacia-Geral da União (AGU) e ser votada na diretoria colegiada.
Seu mandato termina neste ano. O senhor quer aprovar o pacote até o fim do ano?
Pelos prazos que a gente precisa cumprir, acredito que não vou conseguir aprovar. A última reunião da diretoria colegiada é no dia 16 de dezembro, e eu saio no dia 21.
O senhor tem sido firme nas discussões sobre a regulação pela ANS dos cartões de desconto, que atendem cerca de 60 milhões de pessoas, como já comentou anteriormente. As grandes operadoras estão interessadas em atuar nesse mercado?
Não sei, não conversei com as operadoras. Minha ideia é abrir o debate. Temos uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que determina que a agência faça a regulação desse produto. Apresentamos um embargo de declaração, mas é um recurso frágil diante do andar da carruagem. E plano ambulatorial está previsto em lei. Tem uma parcela da população que não tem condições de ter um plano de saúde, tem dificuldade no sistema público, mas que consegue ter um produto que não tem serviços como internação e cirurgia, mas em que é possível antecipar o diagnóstico de uma possível doença. Não adianta querer fechar os olhos. Falam que seria uma dificuldade grande, que teria que ter uma integração do público e privado, porque se essa pessoa é diagnosticada com câncer, por exemplo, ela vai ter que voltar para o final da fila do SUS. Mas se ela não tiver um plano de saúde, ela vai entrar na fila do mesmo jeito. E se eu conseguir antecipar esse diagnóstico, adiantar o processo, dar celeridade? Estamos caminhando junto ao Ministério da Saúde com relação à integração de dados. Além disso, as pessoas têm direito de ter um produto específico, no qual você sabe o que você vai comprar. Não é gato por lebre. Estive recentemente com algumas clínicas e perguntei o percentual de judicialização. (Um empresário) disse que atende dois milhões de pessoas e não tem judicialização, porque sabem o que está sendo ofertado.
Tramita no Congresso um projeto de lei para alterar a regulação, com relatório do deputado Duarte Júnior (PSB-MA). A ANS participa das discussões? Os temas do pacote foram levados ao deputado?
Sim. Participamos de todas as discussões, em todas as regiões do país. Uma das propostas que ele incorporou, inclusive, é uma matéria que seria regulatória, tratada aqui na agência, que é a expansão do pool de risco dos planos coletivos com até 29 vidas.
Fonte: O GLOBO