A criação de um plano de saúde que não dê direito a internação ou terapias, ou seja, apenas com consultas e exames, tem sido alvo de um debate cada vez mais intenso no Congresso. O relator do projeto que pretende modernizar a lei que regula o setor, deputado Duarte Jr. (PSB-MA), resiste a incluir esse modelo em relatório. Depois disso, já se disse que estaria sendo discutida a troca do relator e a polêmica permanece. Nos bastidores, se fala ainda que a inclusão desse formato na nova lei teria sido acordada com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), quando as empresas de planos de saúde firmaram um acordo para interromper a suspensão de contratos de consumidores, após uma enxurrada de reclamações.
Paulo Rebello, presidente da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), tem conversado com Lira, mas afirma que o presidente da Câmara nunca defendeu esse novo modelo de plano de saúde nas reuniões em que esteve. Na sua visão, não há a menor possibilidade de implementação de um plano de saúde sem internação e terapias nesse momento:
“Não há ambiente para essa virada de chave. Sempre tive a visão de que plano de saúde engloba prevenção, tratamento e reabilitação, mas ao se deparar com a realidade, a vida como ela é, uma cliente de 50 milhões de pessoas, a gente entende que a discussão não é tão simples. Que talvez seja possível pensar em alternativas que prevejam atendimento, parte pelas operadoras, parte pelo sistema único.”
Segundo Rebello, seria possível reduzir a fila do SUS utilizando os leitos vagos nos hospitais dos planos de saúde: “Seria possível, por exemplo, atender os cidadãos nos hospitais privados e debitar esse atendimento do ressarcimento ao SUS que os planos de saúde devem fazer quando seus consumidores são atendidos na rede público. Há, em média, 20% de leitos vagos na rede hospitalar privada.”
O plano sem internação ou terapias vem sendo defendido pelas operadoras como uma saída de popularização da saúde suplementar, o que para as entidades de defesa do consumidor, no entanto, vêm nesse modelo a precarização dos planos de saúde. Como já admitiu o presidente da Abramge, associação do setor, Gustavo Ribeiro, o que as empresas do segmento querem é entrar num mercado de milhões de brasileiros que consomem cartões de desconto em saúde. Esse setor, aliás, brevemente poderá vir a ser regulado pela ANS. Uma ação em tramitação terminal no Superior Tribunal de Justiça (STJ) caminha para determinar que a agência reguladora fique responsável pelo ordenamento dos cartões de saúde.
“Teremos que ver o alcance dessa determinação judicial para analisar como será feita a regulação, afinal é uma proposta diferente não é um plano de saúde. Precisaremos estudar como tratar essa questão”, admite Rebello.
Seja como for, diz o presidente da agência reguladora, será necessário uma discussão ampla e profunda sobre a regulação dos planos de saúde:
“Não sei qual seria o modelo, mas o fato é que será preciso todos sentados à mesa, sociedade, operadoras, prestadores de serviços, como hospitais e laboratórios, Ministério da Saúde e até indústria farmacêutica. É uma discussão complexa, em que vamos precisar discutir temas como a incorporação de tecnologias, com análises de custo e efetividade, pensar numa agência única para incorporação de tecnologia para SUS e saúde suplementar. Discutir um modelo de remuneração para esses novos e caros medicamentos, em que haja um compartilhamento de risco com a indústria, caso o tratamento não seja eficaz. Há muito a se debater. Mas essa não é uma discussão para ser feita à toque de caixa, em 60 dias.” –
Paulo Rebello termina seu mandato à frente da ANS em dezembro.
Fonte: O GLOBO